segunda-feira, 28 de abril de 2008

Virada de bosta

Mentira, foi legal, só pus esse título pra fazer a brincadeira besta com o nome do blog.

Ao contrário dos últimos anos, em que me afundei madrugada adentro rodopiando pelos escombros da cidade em busca de qualquer coisa pra ver/ouvir, dessa vez guardei minhas forças para o domingo, perdendo a Virada. Ainda restou o Cultural.

Embora a graça da coisa realmente esteja na madrugada, um combo Cachorro Grande + Arnaldo Antunes + Lobão + Ultraje a Rigor não se acha sempre por aí, de graça e com o céu lindo. Sendo assim, um tchauzinho pro sereno, um olá pro sol. E que sol quente filadaputa, tão quente que espantou as nuvens e, por tabela, quase espantou todos que estavam à minha volta.

Antes ainda desses shows todos, deu tempo de ver o Overcoming Trio, grupelho folk formado pela lindinha Mallu Magalhães, pelo gente boa Hélio Flanders e pelo esquecido Zé Mazzei. No repertório, um monte de músicas do (pai, filho, espritossanto) Bob Dylan, mais umas da garotinha. Aí teve It's all over now, baby blue, Maggie's farm, House of the rising sun (se ela cantasse essa música assim no Raul Gil seria a ídala do meu pai), Simple twist of fade, e outras.

Depois, o Cachorro Grande. Vou ser sincero, depois de vê-los pela sexta vez, o impacto já vem forrado de espuma. Mas é sempre um show divertido, com Hey, amigo, Lunático e My generation.


Tem aquela máxima machista de que panela velha é que faz comida boa. Como o rock 'n' roll é uma biatch, a regra se aplica aqui também. Embora às vezes o tempo afaste o auge criativo para longe, em cima de um palco a experiência é sempre um aditivo (cê tá acompanhando a metáfora, né? Meio vulgar, e tal), e um bando de tiozinhos com rugas nos olhos e cicatrizes nas veias podem manipular uma platéia como nenhum moleque consegue.

O Arnaldo Antunes fez um show excelente, até botou a multidão pra cantar alguns de seus hits obscuros e, evidência forte da chegada da idade, não se sentiu constrangido em fazer algumas estripulias no palco, como um velho que usa a regata transparente pra dentro da bermuda (com a carteira enorme apoiada entre o elástico da berma e o barrigão).

O Lobão é, tipo, o Lobão, né. Ainda faz discos ótimos, ainda fala mais que a boca, ainda é foda bagarai. O show, acústico, foi pesadíssimo, uma desumana violência contra as pobres cordas de aço dos violões. Intercalou músicas do disco da MTV com alguns outros sucessos não desplugados na ocasião, além de encarar a piada fácil e tocar Raul pra um público ensandecido que sabia a letra de Gita de cor (como se alguém não soubesse).

E aí teve o Ultraje. Eles pararam no tempo quase que totalmente. A maioria das músicas apresentadas eram do primeiro (e absurdamente maravilhoso) disco, Nós vamos invadir sua praia, do histórico (pelo menos pra mim) ano de 1985. A música mais nova tocada, Nada a declarar (cu), já é um clássico. Eles são praticamente uma banda cover de si mesmo, se me permitem o clichê. Mas, na boa, foda-se.

Se as músicas têm 23 anos de idade, hoje elas são tocadas com pelo menos 23 anos de técnica musical apurada. Zoraide, Independente F.C., Ciúme, Inútil, Sexo, Pelado, todo mundo cantava tudo, todo mundo pulava tudo. Eles carregavam a platéia no colo, recitavam um dos melhores capítulos da história do rock brasileiro pra vinte mil pessoas que preferiram começar o livro de novo a ter que encarar as últimas páginas. Foi o melhor show que eu vi no ano, mas só porque o do Bob Dylan foi o melhor que eu vi na vida.

E chega, né?

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