sábado, 5 de julho de 2014

Um lugar na história



Eu sei que já escrevi isso por aqui antes, mas vamos lá: eu adoro Copa do Mundo. E apesar de essa estar sendo, até aqui, sensacional - ao menos desportivamente - eu ainda via um certo problema de encaixe histórico nessa seleção brasileira que não a credenciava ao título. E por "credenciar" eu quero dizer que eu não aceito, não com essa bolinha aí.

Estou sendo babaca, já aviso agora. O que eu quero dizer é que, dado o meu apreço pela história das Copas, eu posso tender a ser meio superprotetor com quem eu acho que tem o direito de ser campeão (e eu entendo que se há uma coisa que não tem o menor impacto nisso tudo é a minha opinião). Cada Copa precisa ser uma história, e cada campeão precisa ser um carregador digno dessa bandeira. Ou por se impor tecnicamente sobre os demais (Brasil em 58 e 70), ou por oferecer um desfecho trágico àquele que se impõe (Itália em 82, Alemanha quase sempre), ou por oferecer à conversa o grande craque que se torna o símbolo da conquista (Maradona em 86, Romário em 94, Zidane em 98). E a seleção brasileira dessa Copa de 2014 não tem nada disso: é um time fraco, não-competitivo e cujo tal craque ainda carecia de se demonstrar à altura da tarefa.

Mas então o Brasil jogou contra a Colômbia pelas quartas de final e fez uma boa partida, claramente melhor que as anteriores, claramente insuficiente ainda do ponto de vista técnico. A Colômbia era um grande adversário por ser, essa sim, uma seleção que já havia ocupado seu espaço na história. Vencê-la era um ponto fundamental para o Brasil almejar a mesma coisa, mas ainda não era tudo. Até que no segundo tempo de um jogo em que imperou a lei do sarrafo (de lado a lado) o lateral Zuñiga tentou subir uma escada invisível mas foi deselegantemente interrompido pelas costas de Neymar, encerrando a participação do craque canarinho na Copa que era pra ser sua. Zuñiga e seus familiares foram xingados e ameaçados de morte e outras violências naquilo que há de ser deus testando a humanidade e esta falhando miseravelmente. Faltam escolas no país, é verdade, mas tem faltado também a boa e velha educação que se recebe em casa.

Sem Neymar, lamento dizê-los, o Brasil é um time tão capaz de vencer uma Copa do Mundo quanto eu sou de namorar a Bruna Marquezine. E foi assim, com uma joelhada nas costas e uma lesão infeliz, que a seleção brasileira paradoxalmente se encaixou no fluxo da história e se tornou merecedora do título, ao menos nos meus exigentes critérios.

A seleção brasileira é muito ruim. Meu deus, horrível. Tem dois zagueiros fabulosos, mas também tem o Jô, provavelmente o pior jogador a calçar uma chuteira em todos os tempos, e olha que eu já calcei uma. Mas um time desses vencer a Copa, apesar de todas as suas limitações, impulsionado apenas pelo apoio popular e pela vontade de entregar essa taça a um dos seus (o que é bem diferente de vingança, seus filhos dumas puta) é justamente o que tornaria esse título espetacular, uma das melhores histórias a se contar sobre uma Copa do Mundo. Não seria o Brasil de 70 nem a Argentina de 86, mas seria melhor ainda: seria como o Uruguai de 50.

E isso seria provavelmente o desfecho mais poético de todos: ganharíamos finalmente o mundial em nossa própria casa, exatamente da maneira como perdemos a primeira vez. Dessa vez não seremos vítimas do Maracanazo, mas AGENTES dele. A partir de agora, eu estou proibindo qualquer outro time de ganhar essa Copa: seria um crime contra a história. O futebol é técnica e tática, mas é, antes de tudo, um livro cheio de páginas em branco. Seria escrotice escrever uma história ruim nele.

Nenhum comentário: