quarta-feira, 22 de maio de 2013

Muita ousadia

Ah, os anos 90. Os anos 90 são minha casa - eu nasci nos 80, então isso meio que já estragou a década toda -, e tantas são as lembranças boas que daria pra encher uma caixinha de chiclete. Como eu sou um cara que transgride o tempo e vivo ao mesmo tempo o passado, o presente e o futuro (uma maneira afrescalhada de dizer que sou um crianção), essa década tão mágica ainda vive em mim. E hoje falaremos de dois ícones dessa era, duas lendas vivas - na verdade, uma viva e uma morta - do repertório popular nacional. Hoje, leitoras e leitores, gatinhas e respeitáveis cavalheiros, analisaremos um hino de Claudinho e Buchecha, os reis do funk melody.


Quero te encontrar está no segundo álbum de Cláudio e Claucirlei, A Forma, lançado em 1997 (ah, meus 12 anos, quando eu... sei lá, estudava). Veremos como a canção aborda temas que foram entrar na pauta das conversas do populacho muito depois apenas. Vamos a ela:

Quando você vem pra passar o fim de semana
Eu finjo estar tudo bem,
Mesmo duro ou com grana

A primeira coisa a analisar é: quem é "você"? É uma namorada? Um filho ou filha cuja custódia ele divide com a mãe da criança? Será a empregada, que vai lá passar um pano e lavar a roupa no sabadão? Essa última possibilidade certamente explica a aflição monetária dos nossos heróis.

É que você ignora
Tudo que eu faço
Depois vai embora
Desatando os nossos laços

Bom, se a reclamação é da indiferença da outra parte aos esforços do cantor, perdemos a empregada. Mas acrescentamos uma nova: e se for um(a) parceiro(a) de negócios? Sabemos que o reconhecimento pelos objetivos alcançados é uma das grandes queixas do trabalhador, esse incansável delineador do próprio ego. Mas os dois últimos versos nos dão mais profundidade no drama do personagem: se, ao ir embora, os laços são desfeitos, podemos crer que o intérprete é um freela. Só nós sabemos o quanto a vida de um profissional freelancer pode ser dura ou com grana.

E o leitor mais perspicaz vai sacar da sua cartola de deduções uma nova possibilidade: uma prostituta.

Ora, por que não? Se ela ignora tudo que ele faz, pode ser por se tratar de uma profissional já alargada pelos destratos da profissão, ou apenas uma confissão de humildade peniana do compositor (ou, claro, os dois). E, bem, os dois versos finais são autoexplicativos.

Tantas possibilidades. É mesmo uma canção muito rica. Vamos procurar mais respostas no refrão:

Quero te encontrar,
Quero te amar
Você pra mim é tudo
Minha terra, meu céu, meu mar

ORA, ORA, ORA, já enxugamos bastante nosso contingente aqui, hein? No fim, não surpreendentemente, era mesmo amor. É sempre amor. Ainda não sabemos que tipo de amor: até aqui, podem ser filhos, namorada ou prostituta. Mas vamos fazer uma incursão na floresta negra da simbologia da música brasileira para conseguir mais uma luz.

Como já dito em nossa análise musical anterior, muitas vezes no cancioneiro nacional umas palavras são usadas querendo dizer outras. O caso desse refrão é, talvez, o mais popular do estilo: quando o verbo "amar" quer dizer, na verdade, "comer".

Se o Alexandre Pires reclama que o porteiro novo tá desconfiado, e conclui dizendo que "o melhor é subir, te amar e dormir do seu lado", amigos, ele quer passar-lhe a giromba, se me perdoam a expressão. Amar não é algo pontual, que você vai e faz e pronto. O amor não é um segmento de reta, pois tende ao infinito. Cof cof cof brega do caralho cof cof.  Então, toda vez que o verbo designa algo rápido, direto, pontual, ele quer dizer "comer".

Voltando ao Claudinho Bush, o caso é que você não "quer" amar alguém, você ama ou não. A menos que esteja envolvido num casamento arranjado, para juntar as fortunas das duas famílias e construir um império do ramo do comércio de escravos e, já que você vai ter que casar mesmo, melhor se esforçar pra gostar do(a) parceiro(a). Mas esse não é o caso aqui, pois logo a seguir ele diz que "você pra mim é tudo, minha terra, meu céu, meu mar". Esse amor já existe, não precisa de suor. Desta maneira, o verbo "amar" só pode significar "comer", no que a gente retira a possibilidade dos filhos (sim, eu sei que isso não descarta completamente a alternativa, mas vamos acreditar mais no mundo).

Mas outra coisa chama a atenção: como é que lá no começo da música ele tava todo incomodado com a presença do fim de semana, fingindo, reclamando da ignorância, da partida, mimimi, e agora tá aí DE JOELHOS aos pés da amada? Alguém com nenhum conhecimento das patologias da mente e pouca vontade de se informar no Google vai dizer que nosso personagem claramente sofre de bipolaridade. Eu não tenho nenhum conhecimento das patologias da mente e pouca vontade de me informar no Google, então tomem esse descalabro na cara.

É muita ousadia ter que percorrer
O país inteiro pra achar você
Mas tudo o que faço tem um bom motivo
Preta, eu te amo, vem ficar comigo

Certo, agora esse cara tá sendo só burro pra caralho. Em primeiro lugar, vamos descartar a ideia da prostituta: não acredito que elas viajem tanto pelo país, e, se for o caso, deve ser uma de luxo. Embora Claudinho Buchecha nesse ponto já tenha conquistado um disco de platina triplo, vamos recordar que no começo da canção ele diz que as condições de grana nem sempre são boas, tá fácil pra ninguém. Há de ser então uma namorada, vejam que original. Agora, por que esse idiota está PROCURANDO essa mocreia pelo PAÍS INTEIRO (8.515.767 km²) sendo que ele já sabe que ela vem no fim de semana? Se ela vem no fim de semana e o imbecil não consegue aguentar uns dias na punheta, significa que passa de segunda a sexta viajando. Se estivesse, sei lá, TRABALHANDO, talvez tivesse dinheiro. Até pra contratar a prostituta de luxo, de repente. Mas não, é burro, burro.

Burro.

Estou alucinado com o seu olhar
Vou aonde for até te encontrar
Eu te amo demais, você é minha paz
Faz amor gostoso, de novo comigo, faz

Outra coisa comum na música brasileira é a quantidade de vezes que compositores apaixonados entram em estado de demência por amar outra pessoa. Esse aqui ficou alucinado só com o olhar dela. Imagina a cena: jantar romântico, luz de velas, champanhe, os olhares se cruzam e ele ENLOUQUECE, pula no ventilador giratório, derruba os vasos, corre de quatro, caga no tapete, baba escorrendo, língua bifurcada, pula pela janela aberta e vai embora saltitando pelos telhados da vizinhança. E então ele tem a pachorra de dizer "você é a minha paz". PAZ?! Ela te ignora, te deixa falido, te faz correr esse Brasilzão imenso de segunda a sexta-feira, te arremessa nos braços da loucura e você vem dizer que ela é paz? Se isso é paz, tragam-me a guerra. Isso tem nome, senhores: chave de buceta. Claudinho e Buchecha, os pedófilos, os paranormais, os não-hipócritas, os pegadores, totalmente entregues aos caprichos da prima da Medusa.

E assim terminamos mais um trabalho investigativo. Volto em breve, com mais um mistério musical para desvendar.

(preciso de um slogan de detetive)

Nenhum comentário: