O companheiro que me lê há mais tempo sabe que eu tenho uma banda, e que eu escrevo músicas. Recentemente eu percebi que dei com a cara no muro nesse negócio: esgotou, não sai mais nada, nem torcendo (no sentido de torcer o pano, não no sentido de "me dá um 'V', me dá um 'I', me dá um 'DAAAA DE BOOOSTAAA'"). Como o companheiro que me lê inexplicavelmente tem algum interesse no que eu escrevo, e também pra revisitar esses 4 anos de desserviços prestados à já moribunda música brasileira, pensei em apresentar algumas coisas aqui.
Não apresentar tipo pegar um banquinho e um violão e fazer versões barzinho das canções, mas mostrar alguns trechos de letras usando um filtro que faz sentido para o blog. Explico: ao contrário daqui, onde eu eventualmente tento ser engraçadinho mas ao mesmo tempo finjo que tô falando sério de modo que nunca dá pra saber muito bem se dá pra confiar no que eu escrevo, nas músicas eu procurei fazer as coisas de um jeito mais maduro, mais sereno - apesar do que está escrito num dos links ali de cima. Resultado: frequentemente alguém vem me dizer que morreu de rir ouvindo tal música. Não é pra rir, caralho! Então separei uns versos que levam as pessoas a achar que eu tô querendo ser Tiririca quando eu queria ser Lou Reed, ou frases que todo mundo jura que não fazem o menor sentido quando pra mim são mensagens tão claras quanto um memorando corporativo, ou até algumas coisas que eu me orgulho de ter feito mas só eu achei que são boas. Eis:
Eu sonhei com a Medusa me olhando
Mas ao invés de pedra, eu virei Portugal
Eu não sei muitas gírias de mano
Então vou falar de modo mais formal
Ficção científica
Essa entra fácil no rol das piores coisas que eu já fiz. No refrão eu ainda digo que mijei na toalha da pessoa e termino a música cantando que comprei uma touquinha pra ficar igual ao cara do U2
Te dei minha Trakinas, como pôde
Te amei em Helvetica Extra Bold
Olha
Confesso: o "como pôde" tá ali só pra rimar com "bold", a Trakinas foi citada arbitrária e aleatoriamente e eu tenho quase certeza que roubei a ideia inconscientemente de um documentário sobre a Helvetica
Eu deixo meu amor onde o diabo quer
Os meus sonhos eu guardo numa Tupperware
Só você não vem
Tomara que o diabo não queira que eu ponha meu amor na Tupperware também, pode ser que não caiba
E se eu dormir e não sonhar
Em te foder, em te beijar
Pra que dormir então?
Então (ouve aqui)
Pior que eu acho essa frase bonitinha
Túlio queria comer a Cléo Pires
Mas é impossível
José Luis Fracasso (vê aqui)
Aguenta firme, Túlio
Que eu sou um cara sem muitos amigos
Que eu sou um cara sem nada de mais
Que eu sou um cara sem metas na vida e que mora com os pais
Pra vida ser bem melhor
Esse é um caso reverso: eu achei que tava fazendo algo leve e divertido e ficou parecendo um mimimizão emo foda
E quando a gente bater na porta
Os monstros vão nos convidar para o seu baile de máscaras
E todos usam rostos de celebridades
Eu vou de Lula e você de Beyoncé
Quando a gente virar bosta você vai me querer (vê aqui)
Essa não é a primeira música sobre a dominação de um planeta por outras formas de vida, como você verá adiante. Talvez eu esteja obcecado com isso, não sei
Se pá no espaço, num planeta controlado por zumbis
Ficar do seu lado, estourando miolos, caçando lugar pra se proteger
Dos maiores clichês da cultura pop
Freguesia do Ó
"A gente devia ter uma música sobre zumbis" mas eu não gosto de zumbis
Se houvesse um jeito fácil de ser seu enfoque
Te beijar por te salvar do Ganondorf
Ganondorf (ouve aqui)
- Ai que fofo esse poeminha do seu neto, dona Gisa! Ele tem quantos aninhos, sete?
- É do meu filho, ele tem 28
(eu tinha 25, mas acho que isso não alivia)
Exorcizar o futebol
Por o demônio no gol
Nadar no meio dos teus seios bem molinhos
E seus lábios redondinhos
E lavar a alma
My fake plastic love
Outra na categoria "piores músicas de todos os tempos", além de ter um refrão sobre uma boneca inflável ainda expõe minha materno-dependência ("e os rapazes loucos / que a minha mãe disse pra eu me misturar") e certamente me garantiu um lugar no inferno com o verso "e os Jesuses nunca morrem no cio"
Eu te amo
Mais ou menos
Mas te quero só pra mim
Mais ou menos
Essa foi a primeira música que eu escrevi inteira, letra e melodia. Já expunha minha verve romântica e adulta
Traz a maldade na sacola do mercado
Pra impressionar
Pra enlouquecer
Pra despedaçar aquilo que sobrou
Sendo honesto
Ok, essa não faz sentido mesmo. Mas eu escrevi na época da proibição das sacolinhas plásticas no mercado, e achei que trazendo uma notícia atual pra dentro da canção eu talvez me colocasse na galeria dos grandes bardos do cotidiano, como Woody Guthrie, Bob Dylan e Maurício Ricardo
Escreve torto por linhas certas
Não queira o fogo, deseje a festa
Abrace o medo, transe com fúria
Seja pior
Tudo que o mundo precisa é de um vilão carismático
Essa tá aqui pelo título da música, até porque não dá pra achar que esses são exatamente bons conselhos (tirando o do fogo e da festa, que eu escrevi antes da tragédia em Santa Maria então mais uma vez perdi o bonde dos grandes bardos do cotidiano)
Hoje eu roubei um beijo da garota do rio
Um furto tão bem feito que ela nem sentiu
Calvin e Haroldo (vê aqui)
Eu escrevi essa pensando numa garota meio folclórica, mas de personalidade forte e presença marcante - ela é a garota do rio, ninguém mais pode ser do rio. No final ficou parecendo que eu tô assediando cariocas
Envelhece a foto no Instagram e vê
O tempo que a gente era só eu e você
Tanta água rolou e hoje há uma nação
Eu tenho você, você tem um milhão
Um dia eu percebi que não tinha nenhuma música de corno. Problema resolvido
O seu prazer, o meu pesar
A ironia e o azar
E a mulher que eu amo
Dá o cu pra outro cara
2006
Essa é bem antiga, da época que eu tinha uma banda de mentira pra compensar o fato de que ninguém queria montar uma banda comigo porque eu era ruim demais (mais que hoje). Sempre me pareceu uma imagem triste essa da paixão platônica idealizada estar na verdade fazendo sexo anal com outras pessoas
Rolas gigantes
Voando em frente
Ejaculando nos telhados das casas de inocentes
Outro mundo (ouve aqui)
Essa. Pra mim era uma parábola sobre a futilidade da condição humana, de sua ascensão em busca das respostas e de sua queda por ter feito as perguntas erradas, um libelo sobre a nossa pequenez, um alerta sobre como o processo de conhecimento empírico pode ser obstruído pela ausência de registro histórico. Isaac Asimov, Arthur C. Clarke, Stanley Kubrick, Douglas Adams, Planeta dos Macacos
Mas todo mundo só fala nessas porra dessas rola
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