quinta-feira, 7 de março de 2013

Sobre mortos e vivos

Hugo Chávez morreu, mas não vou falar sobre ele; esse é um assunto sobre o qual eu não me permito dar opinião. Mas vai-se mais um desses anti-heróis carismáticos que a América Latina parece ter um talento especial para produzir. Chorão morreu, e também não vou falar sobre ele. Mas o fato desencadeou uma dessas séries de eventos que tem se tornado corriqueiros na internet em tempos de luto, e deles eu vou falar.

De um lado, comoção e tristeza. Era a voz de um geração, poeta da juventude, lerolero. Não gosto, tô fora, mas cada um sabe a dor que sente e eu respeito. Outros, no entanto, preferiram tentar entender porque as pessoas faziam luto e choravam por alguém que elas não conhecem, que não é o pai delas, cujas músicas são uma bosta e etc. É o tal do povo que acha que em algum momento da evolução da humanidade (eu chuto que seja a internet 2.0) virou uma entidade com autorização celestial para validar o sentimento alheio. Vá entender.

Mas então tem a galera da piadinha. Eu, particularmente, mijaria na cara da mãe de cada pessoa que fizesse graça com a morte de um conhecido meu, mas humor também é bom e é preciso nessa era de tanta tristeza e solidão, beleza. O problema é que às vezes a coisa parece piada, mas é só maldade. Tipo, quando o cara faz uma enquete no Twitter pra saber quem deveria ser o próximo roqueiro brasileiro a morrer e as pessoas respondem "Dinho Ouro Preto, por favor", isso é ruindade pura. Eu não sentiria falta nenhuma do referido cantor, vejam bem, mas daí a pedir "por favor, morra", é um tanto demais. Porque não é que ele faça mal a alguém: a música é ruim, certo, mas até onde eu sei ninguém é obrigado a ouvir. Só que parece que existe essa dimensão paralela ao bom senso que misteriosamente tem acesso às redes sociais em que fazer música ruim é um crime punível com a morte.

Amigos, a morte é um negócio definitivo demais pra tratar com essa leviandade que guia nossas vidinhas urbanas. Só existe um motivo para alguém morrer, que, desculpem o clichê, é nascer. Mais do que isso é ponderação, julgamento e, normalmente, erro. Mas querer que alguém morra, me desculpem novamente, é só maldade. Não é esperteza, não é humor negro, não é "bom gosto" (vinte aspas), é mal-da-de.

E, voltando à tristeza pela morte do cara (eu não ia falar dele, pééém): não sei o que ele fez pela juventude, pelos skatistas, pela música brasileira (tenho um palpite não lisonjeiro sobre esse último). Uns vão julgar ele por todas essas coisas, outros vão lembrar do soco no Marcelo Camelo, e ficaremos nesse maniqueísmo bobo (aqui o nosso morto objeto de análise se assemelha ao morto do começo do texto). Mas cada um sabe onde dói - eu mesmo engoli uma lágrima ou duas quando o Levon Helm se foi há um ano -, e, a esses, meus sentimentos. Pra falar a verdade, os únicos momentos da minha vida que foram de alguma forma marcados pelo Charlie Brown Jr foram aquelas tardes de domingo em que eu e meu irmão ficávamos na arquibancada do Morumbi esperando o jogo começar e os falantes podres do estádio tocavam Lugar ao Sol repetidamente. Foram boas tardes, afinal.

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