A primeira vez que eu vi que levava mais jeito pro desenho que as outras pessoas foi quando eu tinha 10 anos. Inspirado pelos Cavaleiros do Zodíaco, que a gente gostava tanto, eu e a molecada da quarta série resolvemos fazer uma revista em quadrinhos, com histórias de cada um. A revista nunca aconteceu, mas o projeto me abriu os olhos.
Então passa-se um milhão de anos, eu fiz ilustrações de todos os tipos, mais milhares de páginas de histórias em quadrinhos, mais desenho na rua pra Copa, aprendi a usar papeis diferentes, aprendi que não sabia usar pincel, aprendi a usar o computador, e cansei. Me faltava disciplina e dedicação pra melhorar e pra investir, e como eu tinha um emprego que pagava minhas contas e tomava grande parte do dia, o desenho ficou pra lá, como também ficaram a ficção e a contação de histórias. De quadrinhos, só a contemplação; de criação, só esses textos miseráveis do blog e as musiquinhas.
Se você tiver boa memória (ou fizer a bondade de ler esse post aqui) vai lembrar que no começo do ano passado eu larguei mão do desenho oficialmente. O que você provavelmente não sabe é que dois meses depois lá estava eu fazendo um curso de quadrinhos no Sesc Pompeia, com o grande Lourenço Mutarelli. Eu fui lá porque o Lourenço escreve romances, e era essa a minha miragem na época. Acabei sendo sugado pela força centrípeta de volta para o centro do redemoinho, nesse lugar onde só ficavam as minhas memórias de tempos mais felizes e igualmente solitários. Desenhei um bocado, comprei uma mesa, uma luminária e um monte de canetas nanquim descartáveis vagabundas.
Mas não é igual, porque dói. Literalmente, fisicamente. Tenho dor nas costas, tenho dor no braço. Minhas pernas ficam se mexendo, a paciência escorre, a careca sua por causa da luz agressiva em cima dela. Desenhar quadrinhos deixou de ser o exercício de arcadismo mental que era e passou a ser um estorvo. Mas ainda há essa conexão com o centro do furacão, e então eu prossegui, uma página aqui, depois mais quatro páginas, depois mais quatro. Consegui, no final. Eba.
Não sei se prosseguirei com isso. Se me conheço, não vou; se quiser ser a pessoa que eu gostaria de ser, até o final do ano tenho um álbum pronto. Deve acontecer algo no meio desses dois, e se houver coisa que valha a pena e seja pertinente eu publico aqui. Por ora, posso dizer que minhas quatro páginas de desenhos fofos sobre adultério e um futuro drogado serão publicadas numa revista junto com todos os outros adoráveis talentos que frequentaram o curso comigo, ainda que a uma distância segura (saí de lá com o apelido de psicopata, vejam bem). Posso dizer também que foi bom voltar a produzir quadrinhos, mesmo com a dor, e conviver com tanta gente legal mesmo que - como dito anteriormente - a uma distância segura.
E foi bom também poder ter uma real noção do patamar em que se encontra meu traço. Eu já não desenho tão bem quanto antigamente, e certamente muito pior do que eu poderia se tivesse insistido nessa vida, mas se tivesse insistido nessa vida eu não teria hoje esse salário maravilhoso, esses videogames de última geração, essa guitarra irada e essa tristeza que suga as minhas forças como um parasita. Foi uma troca boa. E, pra ser honesto, eu gostei dessa textura de ferrugem sobre os desenhos; não só me fez dar mais valor a cada quadro alcançado como me força a elaborar mais certas coisas que antes eu fazia por instinto e, até por isso, sem muito cuidado. Eu desenho narizes hoje, acho que não desenhava um nariz havia uns dez anos.
Não sei como terminar esse post, então vou resumir: não desenhava mais, voltei, doeu, narizes. E é isso, adeus.
domingo, 24 de fevereiro de 2013
Quadrinhos, narizes e um trem para o passado
Postado por Thiago Padula às 23:19
Marcadores: I hate myself and I wanna die
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