segunda-feira, 31 de março de 2008

Não escrever mais posts sem propósito

Todo mundo pára (três palavras e lá vem um parênteses inútil, mas vamos lá: esse 'pára' agora não tem acento, é só 'para'. Mas como eu sou adepto do português semi-arcaico, vou continuar com essa grafia, além de tremas e crases e essas besteiras que fazem nossa língua-mãe tão bonita) alguma vez na vida pra fazer uma lista de resoluções que, acredita-se, ajudarão o indivíduo a alcançar o caminho para o Eldorado, a.k.a. felicidade. Eu mesmo já até fiz uma aqui no blog, lembra?

O tipo de coisa que se propõe como objetivo de vida viaja pelas mais variadas praias, mas alguns pontos costumam ser comuns para grande parte das pessoas, como ver mais os amigos, procurar um trabalho que dê prazer e aprender a tocar um instrumento.

Se você é mais espertinho já deve ter sacado onde eu quero chegar: ninguém costuma cumprir esse tipo de meta. Vamos lá, 'ver mais os amigos'? E quem disse que eles não têm (essa palavra também morreu, mas não no meu coração) mais o que fazer além de olhar pra sua cara idiota o tempo todo? E como assim 'procurar um trabalho que dê prazer'? Qual a chance de em seguida você não refazer sua lista colocando 'procurar um trabalho que dê dinheiro'?

Mas não se assuste, nem tudo está perdido. O que ninguém ainda percebeu (só eu, porque sou malandro) é que, mais do que 'ler mais livros', é parar para perceber que a vida está uma merda que realmente conta. No fim das contas, cumprir toda essa baboseira que se propõe não vai dar em nada, mas é saudável perceber de vez em quando que tudo poderia ser bem melhor.

Por isso, o meu conselho é que você abra o Notepad agora e comece a escrever sua lista de coisas que você gostaria de fazer mas não vai porque o mundo te empurra para um abismo de tristeza. Aí daqui a dois anos você abre de novo e pelo menos vai poder dar risada daqueles acentos ao contrário que deviam servir para alguma coisa.

segunda-feira, 24 de março de 2008

Inacabados

Eu ando num desânimo filho da puta - a vida tem dessas coisas, a minha tem quase sempre. Mas não pensem que isso é motivo para não escrever nada no blog, porque eu juro que tento, só tá foda de terminar o que eu começo.

E então, em mais um desses esforços bestas para não deixar o espaço abandonado, por mais que isso acabe funcionando apenas como artifício psicológico, resolvi soltar aqui alguns dos textos não finalizados que eu tentei fazer durante esses tempos de blog. Tem mais coisa além disso, mas nem sempre eu me senti suficientemente animado a dar um ctrl+s e tentar salvar meu texto natimorto (adoro essa palavra, qualquer dia escrevo sobre isso. Ou não).

Isso posto, aí vão alguns deles separados por uma fileira de asteriscos, uma das palavras mais feias quando pronunciadas incorretamente.

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Talvez eu esteja ficando velho, e algumas cismas e manias se instalaram no vácuo da minha veloz insinuação rumo à caduquice prematura. Mas o negócio é que já há um bom tempo uma coisa me incomoda ao ponto de me obrigar a fazer uma triste afirmação: a música alta está matando as relações sociais.

Não é nem que eu não goste de ouvir música no talo. Gosto bastante, mas quando estou ouvindo pra mim, no fone de ouvido ou na solidão do meu quarto. Eu só não entendo qual a função da música alta quando há mais de uma pessoa envolvida, a menos que as pessoas

a) estejam ali pra dançar
b) estejam ali pra ouvir a música, como num show ou coisa do gênero
c) estejam constrangidas com a presença uma da outra e a música sirva para tapar o silêncio

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Como ando realmente sem assunto (e saco, e tempo) para escrever nesse blog, vou aproveitar a grande sugestão do João nos comentários do post anterior e listar aqui os shows que eu não vi e ainda quero ver nessa vida. É meio complicado indicar quais artistas podem ser considerados, então vou me limitar àqueles que estão em atividade (o que tira o Led Zeppelin, que certamente seria o primeiro da lista). É mais ou menos assim:

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Algumas coisas são e sempre serão incompreensíveis aos cérebros leigos, incapazes de ver valor além da superficialidade racional em que arremessam o objeto de desprezo. O futebol é um caso clássico.

O argumento padrão para aqueles que não gostam é 'qual a graça em ver 22 homens correndo em volta de uma bola?'

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O que eu acho chato no mundo hoje, geograficamente falando, é que ele é muito pequeno. É muito simples você dar a volta nele (simples em termos mais, ahn, gerais, sem se prender a frivolidades como dinheiro e tempo), perdeu o mistério, perdeu o encanto.

Eu gosto de história, em especial da época das navegações, por conta disso: o mundo todo é um lugar hostil e cheio de surpresas. Eu gostava da primeira fase de Dragon Ball porque era assim, e depois quando eles podiam voar e destruir o universo só com um peido de suvaco mais forte, tudo perdeu a graça.

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Não sei em que ponto da história foi que inventaram essa veadagem de que o principal plano de conflito entre seres humanos deveria ser pelo poder do intelecto, deixando a tradicional porradaria para os bárbaros.

Mas o fato é que coisas tão arraigadas na personalidade de um conjunto (no caso, a humanidade inteira) não são assim tão descartáveis, e desde então uma espécie de rixa se estabeleceu entre a turminha do cérebro e a turminha dos músculos.

Homens e mulheres adoram músculos. Eles adoram os próprios, elas os deles, embora haja, claro, eles que gostam dos músculos delas e elas que gostam dos próprios, mas isso acontece com uma freqüência menor.

Desde os hostis e remotos tempos da pré-história que músculo é sinônimo de força, e força é sinônimo de poder (ok, na pré-história só).

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Existem duas maneiras de lidar com coisas que estão fora do seu alcance: tentando e tentando até chegar ao ápice (tendo o esforço sido ou não em vão), ou desistindo logo no começo.

Sou um adepto da segunda. Sou um desistente profissional - e talvez eu diga isso da próxima vez que me perguntarem minha profissão (ao menos não é tão vergonhoso quanto 'desempregado'). Sabe aquela música do Los Hermanos, 'olha lá, quem sempre quer vitória e perde a glória de chorar'? Então, é mais ou menos assim, só que eu costumo chorar derrotas por W.O.

É um jeito de lidar com a decepção, entenda. Não tenho estrutura emocional pra receber um jato de sentimento negativo de uma vez, então eu absorvo, e vou deixando a coisa ir morrendo dentro de mim. Às vezes pode demorar, demorar bastante, anos até, mas não vou entrar numa briga cuja derrota é certa (já tomei muita goleada, quero mais isso não).

Há coisas das quais não se pode desistir. Tipo arrumar um trabalho (esse tema vai ser muito recorrente por aqui, já aviso). Tenho vontade de mandar tudo à merda todo dia, mas não posso, modern life. Mas tem várias outras das quais eu vou abrindo mão com a mesma facilidade e velocidade com que o patrão carimba aquela pilha de documentos.

O caso é que eu não tenho vocação para a vitória. Voltando à música do Los Hermanos, eu realmente não acho que 'perder é ser menor na vida', embora muitas vezes me pegue um pouco frustrado por ter experimentado tão poucas vezes o gosto de se ter concluído com êxito alguma coisa.

sexta-feira, 7 de março de 2008

Hey, Mr. Tambourine Man, play a song for me

Quando ele e seus talentosos companheiros entraram no palco e começaram a tocar, deu logo pra ver que era Rainy Day Women #12 & 35. As linhas vocais e a letra já não eram a mesma coisa daquela música de 1965, mas esse é um cenário comum e ao qual você tem que se acostumar: ele agora é assim, ponto.

Depois, quando começaram a tocar Lay, Lady, Lay, eu cantei Knockin' on Heavens Door. Erro crasso, minha culpa, eu assumo. E erro feliz, prefiro a canção da senhorita.

E o show foi seguindo, e eu consegui acertar pelo menos as músicas recentes. E nessa levada de acertos das novidades, comecei Highway 61 Revisited cantando Someday Babe. Eu cantava "I don't care what you do" e ele mandava "God said to Abraham 'kill me a son'". Quase a mesma coisa.

Outro erro feliz, Highway 61 é incomparavelmente melhor, e talvez tenha sido o ápice da noite, se não considerarmos a própria noite como sendo o ápice.

Quando, já no final, eles começaram a tocar Like a Rolling Stone, pensei em mandar um 'woooo hoooo', mas então reparei que ninguém mais se empolgou e me controlei - meu retrospecto no 'maestro-uma-nota' estava sendo pífio até então. Mas porra!, era Like a Rolling Stone mesmo, e os bastardos começaram a gritar atrasados. Todos de pé, todos cantando o refrão - que foi hilário, por motivos que você, desafortunado que não estava lá, não merece saber.

Aí ele saiu pro bis, e voltou com Thunder on the Mountain. Essa era fácil, também das novas, e outro ponto alto da noite. Pessoas dançavam em cima das cadeiras - se fosse um show do Vinny, o termo "mexendo as cadeiras" caberia bem -, uma louca subiu no palco e agarrou o véio numa violência que eu achei que ele fosse partir ao meio. Mas aparentemente ele gostou, como testemunham alguns jornalistas por aí (eu juro que não consegui entender o que ele fala). E então, na última música, o bróder do violão bateu um ré.

Um ré. Tudo silenciou-se. Aquele ré dizia tudo, era Blowin' in the Wind, só podia ser. Uma melodia esquisita se seguiu, e então ele se esgueirou ao microfone e cantou "how many roads must a man walk down...". Público ao delírio, e ponto pra mim. No final, um empate justo.



Tem esses bastardos que reclamam que a voz dele está zoada, rouca, desafinada, esquisita, e que as traduções contemporâneas não fazem jus aos clássicos. Pode ser. Mas, confesso, eu não sou santo. Já cometi meus pecados nessa vida, você cometeu também. E, como pecador, eu não sou digno de ouvir as versões originais sendo reproduzidas no palco. O espetáculo de ontem foi um momento de intervenção divina, quando Bob Dylan desceu ao nível dos mortais e espalhou versões coerentes de suas canções num show perfeito. O show que você não viu porque não quis pagar o dízimo. Talvez absurdo, sim, mas como seria minha vida se eu tivesse perdido isso?